A inveja faz parte da natureza humana, desde o seu início. Na história bíblica da gênese, Caim e Abel fazem oferendas a Deus e o olhar do Senhor se volta apenas a oferenda de Abel, fazendo Caim ter inveja. Motivado por esse sentimento, Caim assassina o irmão.
Essa história exemplifica todas as características da inveja, considerada o “pior pecado que existe” pois se volta contra todas as virtudes e toda a bondade. Os outros pecados capitais tem como objetivo conquistar um objeto de desejo, somente a inveja não traz nenhuma conquista pois visa destruí-lo.
A característica principal da inveja é o deleite com a desgraça alheia e a tristeza com a felicidade do outro, atua secretamente, pois dificilmente um invejoso admitirá esse tipo de sentimento.
Antes de conceituar a inveja com mais detalhes é preciso fazer uma distinção entre a cobiça e o ciúmes, usualmente confundidos com inveja.
A cobiça deseja algo que o outro tem e pode ter um lado negativo, mas não necessariamente é um sentimento negativo, já que pode inspirar a pessoa a conseguir aquele objeto ou característica cobiçada com os seus próprios meios. Por exemplo, eu cobiço a paciência de fulano, o que me inspira a tentar ser mais paciente, utilizando os mecanismos internos que eu tenho e desenvolvendo-os ainda mais.
O ciúme tem a ver com sentimento de posse e geralmente há uma triangulação de pessoas envolvidas. Exemplo, duas amigas sempre andam juntas (amiga 1 e amiga 2) e em determinado momento uma terceira amiga entra no grupo e começa a ter mais afinidade com a amiga 2. A amiga 1 fica com ciúme da intimidade das duas pois no mecanismo de funcionamento do ciúme ela pensa que “aquela amiga é dela” (posse) e portanto não pode passar tanto tempo com a amiga 3 (triangulação).
Já a inveja sempre visa danificar ou destruir o objeto invejado, para que ele se torne indesejável. Pode se manifestar através de ataques sutis, revestidos de elogio, ou de formas mais violentas, como o exemplo de Caim e Abel.
Imaginemos a seguinte situação: Uma mulher diz à outra que adorou sua blusa e logo em seguida diz, sutilmente, que esse modelo já está ultrapassado. É possível identificar um ataque invejoso visto que ao dizer que a blusa está fora de moda, ela torna esse objeto indesejável, atacando-o com o comentário. Em um ataque de inveja mais violento ela poderia destruir a blusa (picotando, botando fogo, jogando no lixo) para que ninguém mais pudesse usá-la.
Explicado o mecanismo de ataque externo da inveja, é possível agora olhar para o mecanismo interno. Na Divina Comédia, obra de Dante Alighieri, os invejosos são punidos com arames costurados aos olhos, já que passaram a vida olhando para os outros, são condenados a expurgar seu pecado na cegueira e ouso interpretar, que nessa condição, serão obrigados a olharem para si mesmos.
A inveja é tão dolorosa pois admite incapacidade daquele que inveja e a capacidade do outro. Ela é o reconhecimento do próprio vazio, da própria fraqueza e promove uma cegueira, não vendo em si mesmo a capacidade de conquista.
Por isso a importância da máxima socrática do “conhece-te a ti mesmo”, é através do autoconhecimento e reflexão que é possível combater a inveja e descobrir quais talentos, qualidades, virtudes e ferramentas eu mesmo possuo para conquistar o objeto de desejo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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